segunda-feira, 6 de junho de 2011

Demasiado Humano

Quem sou eu para ousar revolver,
Com o dedo da minha crítica ferina,
A merda estrutural da sociedade?

Quem sou eu para crucificar o corrupto,
Se meu ato maior de cidadania se restringe
Ao voto dominical a cada dois anos?

Quem sou eu para apontar a má conduta do próximo,
Quando a trêmula velhinha padece ao meu lado,
Em pé, e não cedo meu assento,
Confortavelmente aquecido pelas nádegas?

Quem sou eu para delatar vilezas,
Quando sei que o vizinho bêbado bate nos filhos e na mulher
E não ergo um dedo para impedi-lo?

Quem sou eu para denunciar a avareza
Se forro os intestinos no banquete
E nego a migalha ao irmão andarilho?

Quem sou eu para atacar a violência,
Se, quando insultado, não cedo a outra face,
E, com ódio, revido brutalmente?

Eu sou o silêncio que agrava o Mal.
E, se me propusessem, dizer em poucas palavras
O desgosto que me causa minha humanidade,

De pronto, respondo:
Impossível, não cabe nos olhos!